PORTUGAL: MUITO TRABALHO, POUCO CAMINHO

25-07-2025


Quase a chegar ao tempo de férias acho que é o momento de refletir um pouco sobre a natureza do... trabalho!

Não é de agora que sinto, como tantos outros, esta frustração surda que se instalou entre nós: trabalha-se muito, mas anda-se pouco.

É uma sensação que cresce à medida que os anos passam, os relatórios se acumulam e as vidas continuam na mesma.

Há algo de profundamente desconcertante em ver um país inteiro a esforçar-se — e a não sair do lugar.

Portugal aparece recorrentemente no topo dos países europeus com mais horas de trabalho anuais. Aparentemente, somos um povo laborioso, resiliente, determinado.

E somos!

Mas a verdade, dura e crua, é que esse esforço todo não se traduz em bem-estar, nem em progresso palpável.

Os salários continuam baixos. A produtividade estagna. E a sensação generalizada é de um cansaço crónico que não leva a lado nenhum.

Não faz sentido. E é justamente por isso que temos de parar para pensar.

O problema não está nas pessoas, nem sequer na sua vontade de trabalhar.

Está no sistema que organiza esse trabalho.

Está na cultura que o molda, nas estruturas que o controlam e nas lideranças que o orientam — ou desorientam.

Estamos a viver um ciclo de esforço não compensado.

E isso é letal!

Porque o trabalho, quando não compensa, esgota.

Torna-se um fardo.

Deixa de ser dignificante para se tornar apenas exaustivo.

E um país esgotado dificilmente pode ser inovador, criativo ou competitivo.

Não se trata apenas de trabalhar — trata-se de trabalhar bem.

E aí começa o nosso verdadeiro desafio.

A produtividade não nasce da quantidade, mas da qualidade.

E essa qualidade exige organização, visão, planeamento, exigência.

Exige também valorização do tempo, do talento e das competências.

Sem isso, o esforço transforma-se em desperdício!

Tenho visto, ao longo dos anos, empresas onde as pessoas dão tudo de si — e recebem muito pouco em troca.

E não falo apenas de dinheiro, falo de reconhecimento, de sentido, de possibilidade de crescimento.

Trabalha-se muito, sim. Mas muitas vezes, sem saber bem para quê.

A nossa cultura empresarial ainda vive presa a uma lógica antiga, reativa, pouco ousada.

Há empresários que continuam a gerir como se estivessem nos anos 90, fechados ao mundo, agarrados a contactos antigos, receosos de mudar.

E essa postura, que noutros tempos pode ter funcionado, hoje é um travão brutal ao progresso.

Enquanto isso, do lado dos trabalhadores, também há questões a enfrentar.

Vivemos num tempo em que se fala — e bem — de direitos.

Mas temos de recuperar, sem complexos, o discurso dos deveres.

Trabalhar é um direito, mas também uma responsabilidade.

Produzir é essencial. Sem produção, não há redistribuição possível.

Infelizmente, em muitos sectores, a produtividade continua a ser um tema quase tabu.

Parece mal falar nisso, como se fosse sinónimo de exploração.

Mas não é!

Produzir bem é criar valor. E criar valor é o único caminho para um país mais justo, mais próspero e mais feliz.

Precisamos de uma nova ética do trabalho. Uma ética que valorize o mérito, que reconheça o esforço, mas que também exija resultados. Porque o salário justo tem de ser merecido — não apenas reclamado. Esta é uma conversa difícil, mas inadiável.

É fundamental premiar quem faz bem, quem se supera, quem contribui para o crescimento. E é igualmente essencial exigir mais de quem se acomoda, de quem se limita a cumprir o mínimo. A mediocridade não pode ser o padrão.

Num país onde a mediocridade se normaliza, o talento desiste. E quando os melhores desistem, todos perdemos.

Temos, infelizmente, muitos sinais de desistência à nossa volta. Jovens qualificados a emigrar. Profissionais competentes a abandonar carreiras. Gente de valor a perder a motivação. É um desperdício silencioso que nos vai corroendo por dentro.

Tudo isto nos leva a uma conclusão dolorosa: o modelo atual falhou. Trabalhamos muito, mas mal. E não é possível continuar assim por muito mais tempo sem consequências sérias.

É preciso coragem para mudar!

Mudar exige mexer em hábitos, abandonar zonas de conforto, enfrentar interesses instalados.

Mas é o único caminho!

A alternativa é a estagnação definitiva — ou pior, a regressão.

E mudar começa na mentalidade!

É urgente apostar numa cultura de excelência. Isso não significa elitismo, significa exigência. Exigência connosco, com os outros, com as instituições.

Essa exigência tem de estar presente na escola, no local de trabalho, na política, nos media. É um valor transversal. E é ela que cria sociedades dinâmicas, inovadoras, com ambição.

Temos de deixar de ver o trabalho como um sacrifício e passar a vê-lo como um projeto. Um projeto com metas, com sentido, com horizontes. Só assim pode ser verdadeiramente mobilizador.

E para isso, é preciso formação, é preciso liderança, é preciso investimento.

Mas acima de tudo, é preciso visão!

Sem visão, trabalha-se ao acaso. E o acaso raramente constrói futuro.

É urgente valorizar o tempo. Portugal é, muitas vezes, um país onde se perde muito tempo. Em reuniões que não decidem nada. Em burocracias inúteis. Em processos desnecessários. Tudo isso drena energia, mata a criatividade e gera frustração.

Temos de simplificar. Agilizar. Automatizar o que pode ser automatizado. Libertar tempo para o que realmente importa: pensar, criar, inovar, relacionar.

Só assim podemos transformar o trabalho num verdadeiro motor de progresso. Caso contrário, ele continuará a ser apenas um esforço repetido, que cansa sem construir.

Tenho esperança de que ainda vamos a tempo.

Mas não podemos adiar mais esta conversa.

Precisamos de um pacto social novo, que una empregadores, trabalhadores e Estado em torno de uma ideia clara: crescer é preciso, e crescer é possível — se fizermos diferente.

Esse pacto tem de assentar na justiça, sim. Mas também na responsabilidade. Na solidariedade, mas também na exigência. E sobretudo, no reconhecimento de que todos temos um papel.

O país que trabalha muito e anda pouco não é uma fatalidade. É uma escolha. E as escolhas podem — e devem — mudar.

Temos história, temos cultura, temos talento!

Falta-nos, por vezes, acreditar mais em nós — e exigir mais de nós.

Não podemos continuar a achar normal o que é anormal. Nem naturalizar a frustração, o cansaço e a resignação.

É hora de acordar. E de pôr as mãos à obra — mas com método, com inteligência, com direção.

Porque o trabalho, para ser digno, tem de fazer sentido.

E o sentido, neste momento, é mudar de rumo.

Portugal pode ser muito mais do que um país que trabalha.

Pode — e deve — ser um país que avança.

E o tempo de avançar é agora!