PORTUGAL AUTÁRQUICO: MUDAM AS PEÇAS, MANTÉM-SE O TABULEIRO

Realizaram-se as eleições autárquicas em Portugal no passado domingo, dia 12 de outubro.
E, embora muitas peças no tabuleiro político tenham mudado de lugar, a verdade é que o rumo geral mantém-se imutável, preso à inércia que vem marcando o panorama desde as últimas legislativas.
Foi uma noite de vitórias que souberam a empates, derrotas que se disfarçaram de lições e discursos de vitória que soaram a remendos de esperança.
O PSD saiu vitorioso, mas sem convencer.
Ganhou, sim, mas não brilhou.
É um partido que vence por falta de alternativas e não por mérito próprio.
Luís Montenegro conseguiu o que parecia improvável — não perder —, mas falhou redondamente em inspirar confiança ou entusiasmo.
As suas vitórias são mais aritméticas do que políticas. Compensa triunfos pálidos com derrotas pesadas, como as sofridas em Bragança e Viseu, territórios que historicamente eram bastiões do partido.
Há vitórias que têm sabor a derrota.
O PSD, hoje, é um partido morno, anémico e mediano. Vive da memória do que foi e do medo de arriscar o que poderia ser. Montenegro é um líder que gere mais do que lidera, que observa mais do que inspira.
E Portugal continua à espera de alguém que, à direita, saiba conjugar ambição com visão.
O Partido Socialista, por sua vez, continua a cair. Uma queda livre que parece não ter fim, nem travão, nem plano de emergência. O PS ainda mantém alguma expressão eleitoral, mas essa expressão deve-se mais ao mérito isolado de alguns candidatos do que à força da sua máquina partidária.
É um partido exausto, desgastado e sem alma.
A perda de Lisboa e Porto foi mais do que simbólica — foi um sinal de alarme.
Eram as apostas fortes da liderança socialista, a esperança de uma ressurreição política.
Mas a realidade foi dura: o eleitorado urbano, mais informado e mais exigente, rejeitou o discurso gasto e a falta de rumo.
Em Viseu e Bragança, o PS conseguiu vitórias pontuais, mas sem significado estratégico. Foram conquistas locais, fruto de contextos específicos e de candidatos com trabalho feito, não de uma onda nacional. E é isso que mais preocupa: o PS deixou de ter uma narrativa.
Não será com José Luís Carneiro que o Partido Socialista reencontrará a sua alma.
Falta-lhe carisma, projeto e coragem política.
O país olha para o PS e já não vê o partido pilar da democracia, mas sim uma estrutura fatigada, demasiado dependente das suas dinastias internas e das lógicas de aparelho.
Enquanto isso, o CHEGA continua a subir.
E sobe porque André Ventura continua a dominar o palco. É um "one man show" total: o partido é ele e ele é o partido.
O eleitorado sabe-o, mas não se importa.
Ventura fala diretamente a um país que se sente esquecido, revoltado e cansado das promessas vazias dos outros.
O CHEGA venceu três Câmaras Municipais e conquistou centenas de mandatos em assembleias municipais. Não é um número esmagador, mas é politicamente significativo. Pela primeira vez, o partido consolida-se como força autárquica — um passo essencial para a sua afirmação estrutural.
O sucesso do CHEGA deve-se quase exclusivamente ao carisma e à retórica do seu líder.
Os candidatos são, na maioria, secundários.
Mas Ventura conseguiu transformar o voto de protesto num voto de presença.
E isso é, em si mesmo, uma vitória!
O Bloco de Esquerda e o Partido Comunista, por outro lado, caminham para a irrelevância.
Estão presos a um discurso que já não comove, nem mobiliza.
São partidos que falam para si próprios, encerrados em bolhas ideológicas onde a realidade raramente entra.
A participação de Mariana Mortágua numa flotilha pela Palestina, em plena campanha autárquica, foi o retrato perfeito do desespero político — um gesto simbólico, sim, mas completamente deslocado do contexto e das preocupações dos eleitores portugueses.
O PCP mantém a sua fidelidade à causa, mas a fidelidade sem renovação é apenas teimosia.
A cada eleição, o seu eleitorado envelhece e encolhe.
O futuro, para ambos os partidos, parece uma lenta e melancólica despedida.
O CDS, curiosamente, é o único que resiste à irrelevância total. Mantém-se à tona, discreto mas vivo. O trabalho de reorganização interna, ainda em curso, parece estar a dar frutos. E, se for bem gerido, o CDS pode voltar a ter espaço num centro-direita que anseia por coerência e decência.
A sua sobrevivência, num contexto tão polarizado, é quase um feito. E talvez o país venha a precisar de um partido moderado que não seja apenas uma versão pálida do PSD.
A Iniciativa Liberal continua, por vontade e estratégia própria, quase ausência do poder autarquico e bem. A sua forte marca ideológica está focada em sensibilizar o país para o que é, de facto, o liberalismo e isso faz-se com ação nacional e não local.
Em termos nacionais, portanto, tudo na mesma.
A geografia política mudou ligeiramente, mas a paisagem é idêntica.
O eleitorado continua dividido entre o cansaço e o protesto, entre a descrença e a desconfiança.
O mais preocupante, contudo, não é a falta de mudança — é o risco da ingovernabilidade.
Em muitas autarquias, as assembleias municipais ficaram perigosamente fragmentadas.
Há casos, como Porto, Braga e até Coimbra, em que os equilíbrios são tão frágeis que qualquer divergência partidária pode paralisar o município.
A política local, que devia ser o espaço da proximidade e da resolução, corre o risco de se transformar num campo de bloqueios. E quando a política se bloqueia, a vida das pessoas pára com ela.
As autarquias são o nível de poder mais próximo do cidadão. São elas que decidem sobre o lixo que é recolhido, as ruas que são pavimentadas, os transportes que funcionam — ou não. São o rosto da democracia no quotidiano.
Se estas autarquias se tornarem ingovernáveis por jogos partidários, perde o país. E perde, sobretudo, a confiança nas instituições.
O que se espera agora é que os eleitos saibam ser maiores do que os seus partidos. Que percebam que o poder local é, antes de tudo, um serviço à comunidade, e não uma extensão de estratégias nacionais.
O país não aguenta mais ciclos de promessas e frustrações. O eleitorado já aprendeu a desconfiar. Quer trabalho, transparência e resultados. E isso exige maturidade política e sentido de dever.
Luís Montenegro tem agora um teste de liderança à frente: transformar vitórias técnicas em vitórias políticas. José Luís Carneiro terá de escolher entre o papel de líder de transição ou de coveiro do PS. André Ventura precisa de provar que o protesto pode ser governo.
Os próximos meses dirão se as autárquicas de 2025 foram um prenúncio de mudança ou apenas mais um episódio da eterna repetição política portuguesa.
Por enquanto, Portugal continua preso na sua própria rotina: aplaudir a mudança nas urnas e temê-la na prática.
Mas há sempre a esperança de que, um dia, o país acorde. Que os seus líderes deixem de jogar xadrez com o destino dos portugueses e passem a construir, com coragem e visão, uma verdadeira alternativa.
O país precisa menos de vencedores e mais de servidores!
E talvez seja aí que começa a verdadeira revolução política.
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