PARA QUEM SE GOVERNA? E os ilusionistas do poder
Abrem-se garrafas de espumante e fazem-se brindes nos gabinetes e nas salas de reuniões de ministérios de Governantes.
Fazem-se discursos de sorrisos abertos e clama-se vitória!!!!
E tem razão!
A projeção do crescimento da economia portuguesa passou de 0,7% para 2,4% segundo a Comissão Europeia.
O FMI segue a mesma tendência tendo iniciado o ano com uma projeção também de 0,7% e colocando-a agora em 2,6%.
Por isso se abrem as garrafas de espumante, fazem-se os brindes e o orgulho no próprio sucesso é grande entre quem nos governa, dirige e gere a "coisa pública".
E nós?
O povo, o contribuinte, o cidadão, temos razões para também abrir as garrafas de espumante e fazer os brindes?
Não!
Primeiro porque não temos dinheiro para comprar espumante!!
A anunciar o crescimento "histórico" de 2,6% ou mesmo de 2,7%, em vez dos trágicos 0,7%, os mesmos políticos "esquecem-se" que, no mesmo período do ano passado, o crescimento era de 6,7%, que o desemprego estava nos 5,7% e agora está nos 14,2%, que a taxa de juro estava quase 3% mais baixa e que a inflação está quase 2,5% mais alta, isto, retirando, em termos líquidos, 5,5% de poder de compra ao simples cidadão.
A economia está a crescer só se tivermos uma visão obtusa, distorcida e fortemente tendenciosa, descarada e vergonhosamente ilusória dos indicadores económicos.
A verdade é que estamos pior, bem pior!!!!
E não é preciso saber interpretar números e indicadores da Comissão Europeia ou do Fundo Monetário Internacional.
Basta ir ao supermercado, basta ir abastecer o carro, basta olhar para o valor da prestação da casa, basta olhar para o que nos sobra (quando sobra!!!!) no saldo bancário no fim do mês.
Estamos mais pobres, vivemos pior, perdemos, dia para dia, qualidade de vida.
Porque, nós, o povo, estamo-nos literalmente a "marimbar" para as projeções do FMI e os cálculos do Banco Central Europeu!
Pelo menos para mim (e falo somente de mim) os dois únicos indicadores que contam são se consigo pôr comida na mesa e dar uma vida confortável aos meus filhos.
Tudo o resto, para quem anda pelas ruas da realidade e não nos corredores do poder, é mera retórica para (como se diz aqui no Norte) "boi dormir"!
Os meus filhos não comem indicadores, projeções não pagam roupa e tendências de crescimento não são aceites pelo banco para saldar a prestação da casa.
Sendo assim fica-me (acho que a todos) uma grande, mesmo uma ENORME dúvida:
Porque se abre o espumante nos gabinetes?
Simples!
Porque a governação não é feita para o povo e para o país.
O que importa são os indicadores, os números, os gráficos, as projeções.
O que importa é o que refletem os monitores e os data-show.
Claro que os números são reais.
Mas são reais porque há áreas da economia que estão a ter uma alavancagem tão grande e exponencial (como o turismo e a restauração, por exemplo), que influenciam os todos os outros números.
É a velha história dos dois indivíduos que tem 2 frangos. Pelos indicadores cada um tem 1 frango, mas, na realidade (e quase sempre), 1 deles tem 2 frangos e o outro…. Tem as penas...
Mesmo o aumento da rentabilidade de um sector económico pode "arrastar" outros sectores da economia, provocando crescimento, evolução, riqueza sistémica, estrutural e consolidada que é o que nos interessa porque é o tipo de riqueza que torna os países e, logo os seus cidadãos, estáveis, prósperos, que gera bem-estar, estabilidade, justiça social.
Por exemplo o turismo e a restauração, consomem produtos agrícolas, recorrem aos mais diversos tipos de indústria produtiva e transformadora, desde a construção civil ao mobiliário, desde a cultura ao entretenimento, assim como geram necessidades de mão-de-obra.
Mas, de facto, não é isso que se passa, não é isso que acontece.
Porque se está a gerir este crescimento mal, muito mal.
Em vez de reinvestir os proveitos do crescimento na consolidação económica, na produção local, no mercado interno, tornando mais competitiva a economia, as empresas, o comércio, os serviços, isto complementado com incentivos ao crescimento, diminuição da carga fiscal e contributos de modo a, aí sim, gerar crescimento, os lucros do crescimento estão a ser convertidos em ativos financeiros, em depósitos de grandes maturidades ou em derivados de investimento.
Para além do mais o Estado aproveita, sempre (ou pelo menos quase sempre) as flutuações positivas do mercado, como a queda do preço dos combustíveis, para aumentar a carga fiscal, anulando a tendência de recuperação e estabilização do próprio mercado.
O Estado arrecada em vez de distribuir, estagna em vez de progredir, desinveste em vez de investir.
O Estado, em suma, demonstra riqueza em vez de demonstrar progresso.
Porquê?
Porque são esses métodos e mecanismos que geram, de imediato, os números "milagrosos" que os nossos governantes tão orgulhosamente ostentam.
E porquê isto?
Porque os nossos políticos não governam para o povo, para o país, para o real e sustentado crescimento.
Governa-se para o currículo, para a carreira, para o cargo em instituição internacional.
Não acham estranho que um país tão pequeno e periférico como Portugal tenha tantos políticos em tão altos cargos de instituições internacionais?
Presidência da Comissão Europeia, presidência do Banco Central Europeu, Secretariado-geral das Nações Unidas, altos cargos nas mais prestigiadas empresas internacionais (normalmente os mesmos quando saem dos cargos públicos)?
E, o fenómeno, como bem sabem, é transversal da direita à esquerda.
Claro que não se exclui, totalmente, o talento dos detentores dos cargos para os ocupar.
Algum tem….
Se mais não for de sair deste "retângulo" e alcançar os centros decisórios da geopolítica internacional requer muita estratégia, argúcia, inteligência, capacidade e muita "pouca-vergonha".
Mas, de facto, a principal razão, é que Portugal e os portugueses, nós, somos o "trampolim" desses senhores e senhoras para as suas ambições internacionais.
Por isso a necessidade de mostrar números, índices e gráficos a indicar crescimentos incríveis embora, na vida real, tudo esteja igual ou pior, embora, aqui "em baixo", nada melhore e, ao ouvirmos as notícias do tal crescimento, pensem, como eu penso "mas eles estão a falar de que país?"
Quando o Prof. Doutor Aníbal Cavaco Silva (personalidade com que muito antipatizo) no outro dia, proferiu um discurso demolidor para o atual governo, o Primeiro-Ministro defendeu-se com os "claros indicadores económicos que contradizem tudo o que foi dito".
Perante a verdade argumenta-se com o logro, perante o óbvio contrapõe-se o ilusório, perante os factos apresenta-se a manipulação perniciosa.
Veremos o futuro de personalidades como António Costa, Mário Centeno e Fernando Medina.
Temo que o futuro me dará razão!!
Nós, por aqui, como o costume, continuaremos a ser o impulso e a força para voos de que nada beneficiaremos, nem retiraremos qualquer proveito.
Mas não deixa de ser irónico um povo cada vez mais pobre viver num país cada vez mais rico.
Se isto não é ilusionismo, não sei mesmo o que possa ser.