O POVO É, MESMO, QUEM MAIS ORDENA! ou pelo que morreram os nossos heróis?

08-11-2022

Quando alguém escreve este tipo de textos e publicações, assim como quem as lê, procura respostas, opiniões, outra visão sobre os assuntos da atualidade, aqui, na Realpolitik, muito em relação à geopolítica internacional, ao contexto contemporâneo, às circunstâncias deste tempo que é o nosso.

Mas hoje não será assim!

Desculpem!

Hoje só tenho uma coisa: questões!

Muitas e para as quais não consigo encontrar respostas válidas (ou mesmo inválidas).

Vamos, primeiro, ao que me faz ter estas questões.

Jair Bolsonaro não ganhou as eleições no Brasil, mas teve o voto e o apoio de mais de 49% dos votantes e, como vimos na semana passada, de uma franja da sociedade que domina, de facto, a economia e a geração do valor no nosso país irmão.

Mas, por sua vez, Lula, um sindicalista e activista (nada contra) mas que, em tempos, apoiou ações terroristas e a famosa "resistência armada" e que, mesmo atualmente, se recusa a condenar regimes como o da Venezuela, China e Coreia do Norte, foi. E não nos esqueçamos que se se "rotula" Jair Bolsonaro de extrema-direita, o mínimo dos mínimos que podemos fazer em relação a Inácio Lula da Silva, por questões de verticalidade e coerência, é rotulá-lo de extrema-esquerda.

Hoje, terça-feira, 8 de Novembro, realizam-se, nos Estados Unidos da América, eleições intercalares onde será eleito grande parte do Congresso, muitos governadores e parlamentos dos 50 Estados e um bom número de senadores. O mais provável é que grande parte (mesmo a esmagadora maioria) dos eleitos sejam Republicanos Radicais, daqueles que apoiam, incondicionalmente, Donald Trump, as suas ideias e ideais e que acreditam, piamente, que as eleições de 2020 foram manipuladas (mas as de 2016 não!!). Defendem a condição suprema (quase divina) da Nação Norte-Americana, para os quais os "Americanos decentes" são um povo eleito, mandatado por deus para defender a liberdade e ordem (os conceitos de liberdade e ordem são muito, mas muito subjetivos) e que, já agora, a Área 51 existe e o Elvis está vivo!

Acrescente-se que Donald Trump intensifica a sua campanha para a sua candidatura às presidenciais de 2024 e que, tendo em conta a completa inabilidade do Partido Democrata para governar e para se governar, essa reeleição é mesmo muito provável (agora com a quase certeza de 2 mandatos).

Mais: Giorgia Melon é primeira-ministra de Itália, Viktor Orbán governa e continua a somar apoio e popularidade na Hungria, o mesmo com Jaroslaw Kaczynski na Polónia, Heinz-Christian Strache na Áustria, Andrej Babis na República Checa, a aliança ultranacionalista Patriotas Unidos liderada por Boiko Borissov domina, com mão de ferro, a Bulgária e mais um punhado de países na Europa e pelo resto do mundo que veem os seus regimes serem dominados por partidos ultranacionalistas (tanto de direita como de esquerda), de alguma forma segregacionistas que põe em causa direitos, liberdades e garantias que tínhamos como assumidos, eternos, imutáveis, inalteráveis, sagrados.

E, que se saiba (e acredito mesmo nisso), nenhuma destes atos eleitorais foram, de nenhum modo, manipulados e muito menos fraudulentos.

Não falo, neste artigo, de regimes como a Federação Russa, a Turquia, a Venezuela em que os atos eleitorais são considerados, pela comunidade internacional, como declaradamente manipulados ou, pelo menos, não "transparentes", logo, fora do âmbito da minha reflexão de hoje.

Isto é (e vamos encarar a realidade como pessoas crescidinhas que somos): todos estes partidos, todas estas pessoas foram eleitas democraticamente, livremente, são a expressão real da vontade popular.

Não falamos de regimes opressores que se fazem eleger, falamos antes de regimes opressores que são eleitos, pelo povo que é aquele que mais ordena.

E agora vem as tais questões:

O que está a conduzir a maioria da população a apoiar movimentos que, em muito, negam a própria democracia e os seus ideais?

Depois de 50 anos em que o mundo lutou, incansavelmente, pela liberdade, pela igualdade, pelo fim das discriminações, do racismo, da desigualdade de género, pela liberdade de expressão, de consciência, de associação política, da separação clara e inequívoca entre o Estado e a religião, o que faz toda uma maioria, cada vez menos silenciosa, opor-se, nas urnas, a esses ideais ou pelo menos a parte deles?

Que cultura política, que consciência cívica criamos no nosso eleitorado que torna possível que acreditem nas mais absurdas demagogias, nas mais ridículas teorias da conspiração, que votem em pessoas que sugerem que se injecte lixívia para combater vírus, que apregoam como ideal de governação "Deus no Comando" e acham que os clipes metálicos das máscaras cirúrgicas são antenas recetoras de 5G para nos fazer uma "lavagem cerebral" e votar no opositor?

Que classe de políticos estamos a criar que cada vez baseiam mais os seus programas em populismos, demagogias e ilusões e não em medida concretas e realistas de governo, de gestão e de estratégias de sustentabilidade para os países e para o mundo?

Que ambiente político estamos a criar que já não há ideologias, já não há base filosófica para os partidos e movimentos e tudo se funde numa amálgama indistinta de coisa nenhuma em que nem os militantes dos partidos sabem dizer o que os distingue dos outros a não ser a cor do cartão e a ânsia de cargos e poder?

Que porra de mundo vamos nós deixar aos nossos filhos? (desculpem-me a linguagem).

E não digo isto, sinceramente, com aquele típico saudosismo mofento e reumático de quem já sente o passar dos anos e a sensação de estar a ser ultrapassado por eles.

Não!

Faço estas questões porque estou mesmo interessado nas respostas.

Tenho 2 filhos pequenos e preocupo-me, obviamente, com o seu futuro!

Porque, minhas caras e meus caros, o problema não é do Bolsonaro, do Trump, da Marie Le Pen, nem de todos os outros "compinchas" populistas tanto da direita como da esquerda.

Não é!

Porque radicais, populistas, estúpidos e mentecaptos sempre os houve e continuará a haver.

O problema é que eles agora são eleitos e são eleitos democraticamente, por sufrágio direto, universal e justo!

O problema não está em quem é eleito, mas antes em quem elege.

A democracia está a ser a sua própria destruição

E, quanto a isto, e infelizmente, não tenho respostas, não tenho soluções, nada.

Sinto-me, honestamente, perdido, desorientado, impotente.

Defendo, com a minha própria vida se necessário for, a democracia e os valores democráticos, o primado absoluto e inquestionável da vontade popular, da universalidade absoluta e total do voto, do carácter inquestionável da soberania representativa.

Mas... mesmo que tudo isso, ao se realizar, se negue?

Pode o totalitarismo utilizar a democracia para se impor e afirmar?

E, se assim for, o que fazer?

Esta semana, na próxima sexta-feira, no 11º minuto, da 11ª hora, do 11º dia, do 11º mês o mundo anglo-saxónico pára. Em especial no Reino Unido e nos países da Commonwealth celebra-se o Dia da Lembrança (Remembrance Day). Todos usam papoilas vermelhas ao peito, inspiraras pelo célebre poema de John McCrae "In Flanders Fields" (recomendo a leitura em https://www.britishlegion.org.uk/get-involved/remembrance/about-remembrance/in-flanders-field ou a sua audição pelo grande Leonard Cohen em https://www.youtube.com/watch?v=cKoJvHcMLfc ).

Nesse dia, com esse poema, com essas papoilas, lembramo-nos e honramos todos aqueles que, ao longo dos tempos, deram a sua vida, fizeram o derradeiro sacrifício, pelos ideais da liberdade, da igualdade, da fraternidade, da democracia. Tombaram heróicos, deixando filhos e esposas, mães e maridos, irmãos e amigos, deixando a vida, abandonando sonhos e projetos, para que todos nós pudéssemos viver livres, para que a tirania, a opressão, a ditadura, o obscurantismo, o radicalismo, não vencessem, não crescessem, não vingassem.

Nessa luta deixaram sangue, suor e muitas, muitas lágrimas de camaradas que não voltaram.

E hoje, em dia de questões, eis as duas últimas:

Porque morreram eles?

Morreram eles em vão?