O FUTURO DE PORTUGAL!

11-03-2024


Sabem que não gosto e, raramente, falo sobre política nacional.

Em primeiro lugar porque acho que já há demasiada gente, e muitos deles muito melhores do que eu, para falar da política portuguesa.

Por outro lado, o Realpolitik tem como objetivo a análise da geopolítica e geoestratégica global e, por isso, raramente a política interna de Portugal se enquadra nesse âmbito.

Mas as eleições que decorreram a 10 de Março foram tão particulares e tão sui generis que não resisti a fazer uma análise.

No momento em que vos estou a falar a Aliança Democrática (AD) consegui 29,5% dos votos, o Partido Socialista (PS) 28,7%, o Chega 18,1%, a Iniciativa Liberal (IL) 5,1%, o Bloco de Esquerda (BE) 4,5%, o Partido Comunista Português (PCP) 3,3%, o Livre 3,3% e o Pessoas, Animais e Natureza (PAN) 1,9%.

Falta, neste momento, apurar os deputados a serem eleitos pelo círculo da Europa e do resto do mundo, que são 4, mas se a tradição se manter, serão distribuídos igualmente pelo PSD e pelo PS não interferindo no número que temos agora.

Relembro que esta é uma análise política e não partidária, que isto é Realpolitik e não política ideológica.

Neste espaço, como sempre, fala-se do que é e não do que devia ser ou gostávamos que fosse.

Desculpem-me a franqueza, mas quem gostar subscreva o canal, quem não gostar não veja.

Vamos começar pela Aliança Democrática.

PSD, CDS e depois, para cumprir a tradição, o PPM, uniram-se em coligação tentando reeditar a iniciativa de Francisco Sá Carneiro, Diogo Freitas do Amaral e Gonçalo Ribeiro Telles.

Brilhante ideia!

Mas para quem?

Para uma franja pequeníssima do eleitorado que se lembra desses dias de glória.

Quem decide as eleições hoje em dia mal se lembra ou nem era nascido no início da década de 80.

Em segundo o argumento é mau porque já passaram 40 anos e os tempos, as circunstâncias e o contexto são completamente diferente desses tempos quase pós-revolução.

Outro fator é que não se resolvem problemas de hoje com fórmulas de ontem, ou, neste caso, de anteontem.

Por último Luís Montenegro, Nuno Melo já para não falar de Nuno da Câmara Pereira estão longe, muito longe, das qualidades políticas e intelectuais dos fundadores da primeira AD.

Quem nos dera, tanto à direita como à esquerda, ter, de novo, uma geração de ouro de políticos como tínhamos naquela época, de Sá Carneiro a Mário Soares, de Freitas do Amaral a Álvaro Cunhal!

Por isso a Aliança Democrática começou por ser uma má ideia, desenquadrada, descontextualizada que só prova que os decisores e estrategas políticos do PSD e do CDS, não fazem a mais pálida ideia do eleitorado com que estão a lidar.

Por isso não se antevia nada de bom desde o anúncio da coligação a não ser o regresso do CDS ao parlamento.

Depois não duvido, nem um segundo, da seriedade, honestidade e competência de Luís Montenegro.

Vejo nele um cidadão reto, um patriota, alguém que vê a política como um serviço e que faz tudo que está ao seu alcance para dar o melhor a Portugal e aos Portugueses.

Mas isso não chega... infelizmente....

Uma ideia, um programa, uma visão não se bastam a si próprios.

Tem de ser "vendidos", propagados, tem de se envolver as pessoas, convencê-las, conseguir entusiasmo, apoio, é preciso unir os cidadãos em volta de um ideal.

Eu sei que a politica devia ser razão e não emoção, mas, na realidade é muita emoção e pouca razão.

O eleitorado não vota em programas, vota em promessas; não vota em medidas, vota em empatias; não vota em realidades, vota em sonhos.

Não devia ser assim, mas é o que é.

E é precisamente esse envolvimento, essa paixão, essa emoção que Luís Montenegro não consegue despertar no eleitorado.

Nuno Melo é bastante melhor mas teve de se remeter a figura secundária da coligação, pagando muito caro a cobardia de não ter sucedido a Assunção Cristas na liderança do CDS e permitindo que uma nulidade política, o "Xicão", destruisse a obra de Diogo Freitas do Amaral, Francisco Lucas Pires e Adriano Moreira.

O mau calculismo politico de Nuno Melo de não querer ser ele a fazer "a travessia do deserto" que era certa depois do encerramento definitivo da "época Portas", condenou quase à extinsão um dos partidos fundadores da nossa democracia e uma referencia incontornável da democracia esclarecida em Portugal.

Veremos se a AD, pelo menos, tem o mérito de remediar este facto.

Mas, em à AD, foi a falta de carisma, de capacidade de mobilização e de gerar emoção que condenou Luís Montenegro e a coligação.

Luís Montenegro é aquele senhor simpático que a minha avô convidaria para o chá das cinco e não é desse tipo de pessoas que se fazem os grandes líderes políticos.

Por isso considero que a AD, em especial o PSD, teve uma das piores derrotas quase desde o 25 de Abril de 74, embora tendo vencido.

Porque, depois de 8 anos de governo PS e consequente desgaste politico e social, depois da queda estrondosa de um governo suportado por uma maioria absoluta parlamentar, ao fim de somente 1 ano e meio de mandato e logo por causas relacionadas com corrupção, ainda mais com um passado também assombrado pela corrupção com José Sócrates (que teima em não se calar), com uma contestação social quase total, desde as policias aos professores, médicos e enfermeiros e restante função pública, não capitalizar tudo isto numa vitória estrondosa, mesmo numa maioria absoluta, é uma derrota avassaladora sob todos os prismas.

Ficar a menos de 1% depois de tudo isto deve levar o PSD a fazer uma reflexão profunda das suas estratégicas políticas, da capacidade dos seus quadros técnicos, dos seus analistas, da competência dos seus dirigentes.

O discurso de "consagração" de vitória de Luís Montenegro na noite das eleições foi o epílogo de tudo isso: morno, vazio, cheio de lugares-comuns, as mesmas fórmulas que utiliza desde o início da campanha, sem energia, sem garra, sem motivação, sem liderança.

No PS passa-se exatamente inverso.

É uma das maiores vitórias de sempre do Partido Socialista.

Mostra que Pedro Nuno Santos é um político nato, com um sentido de estratégia fantástico, com uma versatilidade incrível e uma capacidade de adaptação inigualável.

Mais. mostra a capacidade que Pedro Nuno Santos tem de aprender com os erros!

Do rapazote impulsivo, arrogante e mal-educado que vimos como Secretário de Estado e depois como Ministro, durante esta campanha vimos uma evolução absolutamente notável.

A ambição desmedida continua mas agora com grande estilo.

Não se prende a grandes ideais de coerência, verticalidade e honradez.

Contradiz hoje o que afirmou ontem, nega o óbvio, afirma o absurdo, mas fá-lo com tal arte e engenho que mobiliza, que envolve, que apaixona e até convence.

Convenceu o país que o PS seria diferente mantendo as mesmas pessoas, as mesmas ideias e as mesmas políticas.

Conseguiu convencer o povo que ao fazer exatamente o mesmo iríamos obter resultados completamente diferente!

É absolutamente notável!

Pedro Nuno Santos tinha uma tarefa quase impossível em mãos:

salvar o PS de um desaire eleitoral absoluto, de se passar de uma maioria absoluta de esquerda para uma maioria absoluta de direita.

E não só consegui isso como quase vence as eleições.

O xeque-mate de Pedro Nuno Santos a Luís Montenegro é, sem dúvida, o discurso em que assume a derrota.

Surge com uma elevação, um sentido de Estado, de dever, de democracia que não lhe conhecíamos.

A derrota de Pedro Nuno Santos transforma o rebelde em político e o militante em figura de Estado.

Para além de mais, ao assumir a derrota obriga Luís Montenegro a assumir a vitória e, com isso, a mergulhar no inferno em termos de governabilidade.

Pois ainda não falamos do grande e absoluto vencedor da noite de eleições:

o Chega.

Para clarificar as coisas quero afirmar que não acho nada o Chega um partido de extrema-direita, xenófobo, racista e radical.

Há militantes do Chega que são xenófobos, racistas e radicais?

Claro que sim!

Mas também há militantes do Partido Comunista e do Bloco de Esquerda que apoiam a invasão da Ucrânia, o regime norte-coreano e venezuelano e se negam a condenar o estalinismo e visto isso não há problemas com isso.

Depois, ninguém me convence que 18,1%, dos meus concidadãos são fascistas, xenófobos, racistas e sexistas.

Tentar assustar o eleitorado com o "bicho-papão" da extrema-direita e do fascismo em relação ao Chega é simplesmente idiota, absurdo e conduz a resultados como os que se concretizaram nas eleições.

Sabem o que é o Chega?

É um partido que é a negação da política, é um partido sem ideologia, sem ideias, sem bases conceptuais, sem origem filosófica.

O Chega é negação absoluta do sistema, não se vincula a nada, não nega nada, não afirma nada para além do óbvio.

O seu discurso é o lugar-comum, a sua base é o senso popular, a sua retórica o da mesa do café ou da sala de espera do centro de saúde.

E foi por isso que teve esta estrondosa vitória!

Porque o povo, o eleitorado está farto de políticos e de políticas, de discursos europeístas, de grande estratégias que nunca se concretizam, de tecnicismos que ninguém entende, de "mentes iluminadas" que tratam os cidadãos como rebanhos ignorantes que nem sequer sabem o que é melhor para eles próprios.

O povo está cheio de uma elite política que se acha acima de tudo e de todos, que cultiva a demagogia, a iliteracia política e financeira, o eleitoralismo fácil e vazio.

O povo não quer saber de balanças orçamentais, equilíbrios este-oeste ou de medidas de estabilidade cambial (embora isso interferida, em muito na sua vida).

O povo quer saber da conta do supermercado, de ter médico quando está doente, do preço dos passes, dos combustíveis, das escolas.

É preciso falar de política real para pessoas reais, é preciso falar a linguagem do povo e não dos génios de Bruxelas.

A ideologia do Chega é não ter ideologia.

É antes dar voz política e visibilidade mediática ao que a grande parte da população pensa, acredita, defende e reclama.

O Chega não impõe nada a ninguém.

É o que seu eleitorado quer que ele seja.

Ponto!

Gostem os intelectuais ou não, seja contra ou a favor das grandes diretrizes europeias, enquadra-se ou não nas grandes orientações das Nações Unidas...

Não querem saber!

Pode parecer um contra-senso mas o Chega é o partido mais democrático do nosso espectro político e o seu resultado eleitoral prova-o para além de qualquer dúvida.

Os latinos diziam "vox populi, vox dei".

A voz do povo é a voz de Deus.

E os partidos tradicionais esqueceram-se que não ouvir a voz de deus normalmente resulta no aparecimento de Messias!

Porque essas mentes iluminadas estavam tão seguras de si que achavam que um povo ignorante e alheado era muito mais fácil de governar que um eleitorado esclarecido e interventivo, logo, que facilitaria a sua perpetuação no poder.

Mas um eleitorado ignorante em termos políticos, económicos e financeiros, alheado da real gestão do Estado é aquele que acredita que é possível banir as portagens ou subir num ano o ordenado mínimo para os 1000€.

O populismo só é possível na ignorância, a demagogia só é possível na iliteracia.

O Chega é a criação plena e acabada dos partidos do sistema.

Os partidos tradicionais não podem agora bradar impropérios à sua própria criação.

Agora:

o Chega teve mais de 1 milhão de votos.

1 milhão de portuguesas e portugueses votaram nesse partido, goste-se dele ou não.

E, espero, que ninguém, mas ninguém mesmo, se esqueça, que a vontade do povo é absolutamente soberana, que a expressão do voto é sagrada e que, de facto, é o Povo quem mais ordena, seja qual for essa ordem.

O Chega terá que ser respeitado e tido em consideração na futura governação de Portugal.

Porque?

Porque os portugueses assim decidiram.

Cabe a todos os partidos mostrarem, de uma vez por todas, até que ponto são democráticos e até que ponto respeitam a vontade popular.

Os outros partidos:

A Iniciativa Liberal manteve o resultado, mas perdeu vigor.

Se não fizer uma reflexão profunda da sua estratégia e não resolver os problemas internos poderá acabar por se extinguir.

Uma pena, porque, de facto, em Portugal, faz falta um partido que corporize os ideais do Liberalismo e que tem muitos adeptos, eu inclusive.

O Bloco de Esquerda também se manteve, "alimentado" pela "esquerda caviar", mas está cada vez mais  vazio de ideias, de causas, de motivos.

Precisa de se renovar, se reinventar, de se "refrescar".

E isto muito devido ao Livre, outro dos vencedores da noite e que quadruplicou os seus resultados.  O Livre é, dos partidos de esquerda, o mais coerente, o mais sensato, o mais sólido em termos ideológicos, com políticas e estratégias concretas e definidas para Portugal e para os portugueses.

Portugal precisa de uma esquerda como o Livre e Rui Tavares é um dos políticos mais capazes, esclarecidos e completos do nosso panorama partidário.

Arriscar-me-ia a dizer, eu, de direita, liberal, conservador e monárquico, que o Livre foi o único partido que apresentou um programa eleitoral digno desse nome e uma estratégia para Portugal clara e definida embora eu não concorde com ela.

O Partido Comunismo Português....

Em primeiro lugar quero afirmar que todos nós, portugueses, temos uma dívida imensa e que nunca conseguiremos saldar, em relação ao Partido Comunista Português.

Foi o PCP que manteve, durante décadas, a luta anti-regime, contra o Estado Novo, a ditadura e o fascismo, sendo muito, mas mesmo muito, devido ao seu esforço, dedicação, entrega e sacrifício que foi possível o 25 de Abril de 1974.

Pena que, depois, tivesse de se dar o 25 de Novembro de 1975 (os mais novos vão ao google e pesquisem estas datas).

Hoje o PCP é uma múmia política, que não tem causas a defender no contexto atual, cristalizado numa ideologia anacrónica, descredibilizado pela história, condenado pelos factos.

Ano depois de ano, eleição depois de eleição, os velhos e fiéis camaradas vão indo e caindo e sem horizontes e espaço de renovação, resta ao PCP o seu lugar na história, a gratidão dos portugueses e a extinção política.

Quanto ao PAN é um fenómeno sectorial da sociedade urbano-depressiva que cada vez terá menos expressão e que, por isso, acho que nem se enquadra no âmbito da análise política.

E qual o resultado disto tudo?

A Aliança Democrática vai formar governo.

Luís Montenegro não tem força nem fibra, nem à sua volta quem tenha, para gerir uma situação política tão delicada como a que resultou destas eleições.

O PS e o Chega vão viabilizar o governo e depois vão esperar que, uma depois de outra, caiam as promessas eleitorais do partido vencedor.

A Aliança Democrática, vai, desesperadamente, tentar manter-se no poder e, para isso, ou vai tentar aproximar-se do PS, que rejeitará a aproximação, ou então do Chega que implicaria a perda total de coerência, legitimidade e ética politica, condenando ao descrédito e ridículo o PSD e o seu líder, e passando, para as mãos de André Ventura, o real poder.

Este "pântano" político vai perdurar até às Presidenciais com um progressivo e acelerado desgaste do PSD e um fortalecimento do PS e do Chega que só terão que ter paciência, aguardar e ir dando uns "toques" subtis a Luís Montenegro para que ele cada vez mais se enfraqueça, descredibilize, cometa erros provocados pela pressão e comece a criar oposição dentro do próprio partido.

Depois das Presidenciais será o próprio PSD, desgastado, exausto, enfraquecido e minado por lutas internas, que decretará a queda do governo retirando a confiança política ao seu líder.

Juro-vos que espero estar completamente errado e que vocês, dentro de 4 anos, me chamem néscio e otário!

Garanto-vos que nada me daria mais prazer!

Porque o que eu quero é um Portugal forte, dinâmico, pujante, digno de si e da sua história, confiante no seu futuro, um Portugal onde os portugueses possam viver, uma terra de encontros e não de despedidas, de futuros e não de desilusões, uma terra de oportunidades e não de desesperos.

Quem viver, verá!