O CREPÚSCULO DO OCIDENTE: UM ANO EM SUSPENSÃO

26-12-2025


O ano que agora se aproxima do fim deixará uma sensação agridoce.

Tanta coisa aconteceu, tantas manchetes, tantas crises, tantos discursos inflamados — e, no entanto, a sensação geral é a de que tudo permanece igual.

Vivemos tempos de ruído, mas com cada vez menos som.

A espuma dos dias cobre uma realidade que se move lentamente, quase impercetível, enquanto o mundo — esse organismo inquieto — começa a mudar de direção sem que o percebamos por completo.

Em Portugal, a política continua a ser um espelho gasto de promessas repetidas e desilusões previsíveis.

O ciclo eleitoral trouxe o habitual fervor das campanhas, as frases feitas e os anúncios de reformas que nunca chegam.

Mudam-se rostos, trocam-se siglas no poder, mas a estrutura permanece intocável.

A economia cresce a ritmos modestos, os salários continuam presos ao passado e a juventude emigra com a serenidade de quem já não espera nada.

A sensação é de paralisia — uma espécie de resignação coletiva onde o costume se confunde com destino.

O país político, fechado sobre si mesmo, parece incapaz de compreender que o mundo à sua volta mudou profundamente. A obsessão com o curto prazo, a dependência de Bruxelas e o medo de contrariar a narrativa dominante transformaram o governo e a oposição em espelhos um do outro. Portugal vive, politicamente, num limbo confortável, onde se fala muito e se faz pouco.

Mas não é apenas uma questão nacional. Lá fora, o mundo inteiro atravessa um ano de turbulência. Guerras antigas continuam, novas tensões emergem e o mapa global reconfigura-se lentamente. O conflito na Ucrânia mantém-se num impasse sangrento, com uma Europa dividida entre a fadiga e o dever moral. O Médio Oriente voltou a arder, lembrando ao Ocidente que a paz que julgava consolidada era apenas um intervalo.

Os Estados Unidos entraram em mais um ciclo eleitoral envenenado, com uma sociedade polarizada e instituições que dão sinais de exaustão. A democracia americana continua a ser uma referência formal, mas a sua vitalidade está em causa. O império debate-se com as suas contradições internas, enquanto o resto do mundo observa, consciente de que o centro de gravidade global está a deslocar-se.

Na Europa, o desencanto é palpável. O projeto europeu, que em tempos foi um ideal de paz e prosperidade, vive hoje uma crise de identidade. A burocracia sufoca o ímpeto político, a solidariedade entre Estados é mais retórica do que real, e a dependência energética e militar dos Estados Unidos revela uma fragilidade estrutural. A União Europeia fala muito em "autonomia estratégica", mas raramente age de forma autónoma.

A Alemanha enfrenta a sua própria crise económica e moral, a França vive sob o espectro permanente da revolta social, e o Reino Unido continua à procura de si mesmo depois do Brexit. É um continente cansado, que se olha ao espelho e já não reconhece o rosto que vê.

Entretanto, no chamado "Grande Sul" — o Sul Global —, o movimento é outro. Lento, mas seguro. A Índia afirma-se como potência tecnológica e demográfica, a China consolida a sua influência económica e diplomática, e o continente africano começa, timidamente, a tomar consciência do seu próprio peso estratégico. O Brasil tenta regressar a um papel de equilíbrio e liderança regional, enquanto novas alianças — como os BRICS — ganham relevância e desafiam a ordem estabelecida.

O mundo multipolar deixou de ser uma previsão para se tornar uma evidência. O Ocidente já não dita sozinho as regras do jogo. O dólar continua forte, mas a sua hegemonia já é contestada. O modelo liberal ocidental, que durante décadas foi apresentado como destino inevitável da humanidade, está a ser questionado por novas narrativas — mais pragmáticas, mais nacionalistas, menos idealistas.

Tudo isto acontece num contexto de aceleração tecnológica e de transformação social sem precedentes. A inteligência artificial, a transição energética e o controlo dos dados tornaram-se os novos campos de batalha. E, no entanto, os grandes debates políticos continuam presos ao passado, às mesmas dicotomias, aos mesmos discursos.

Há algo de profundamente simbólico neste contraste entre movimento e imobilidade. O mundo muda, mas os sistemas políticos parecem incapazes de acompanhar. O Ocidente envelhece, não apenas nas suas populações, mas nas suas ideias. As suas instituições, criadas num tempo de certezas, mostram-se frágeis perante a incerteza contemporânea.

A crise é mais profunda do que económica ou militar — é civilizacional!

É a crise da confiança, da coerência, da esperança.

Quando tudo se transforma em espetáculo, o essencial perde-se!

A política tornou-se um exercício de gestão da aparência, e o poder, um jogo de sobrevivência mediática.

Os cidadãos, cada vez mais céticos, afastam-se. A abstenção cresce, o desinteresse aumenta e o voto torna-se mais castigo do que escolha. A democracia, que sempre viveu da participação, definha na indiferença. O problema já não é apenas quem governa, mas se alguém acredita verdadeiramente que governar ainda muda algo.

E, no entanto, há uma sensação estranha de expectativa. Como se o mundo inteiro estivesse à espera de um acontecimento, um ponto de viragem que ainda não chegou. Um evento — talvez pequeno, talvez simbólico — que marque o fim de uma era e o início de outra.

Em 2025, a história parece suspensa. Os impérios declinam, mas ainda não caíram. As novas potências ascendem, mas ainda não tomaram o lugar. O mundo está em transição, mas a direção final continua por definir.

O Ocidente, acostumado a ser o centro, resiste a aceitar a sua nova posição periférica. Fala de valores universais, mas já não tem a força para os impor. Fala de democracia, mas vive cercado por populismos. Fala de progresso, mas teme o futuro.

Enquanto isso, o "Grande Sul" observa e constrói. Com prudência, com estratégia, com um sentido histórico que o Ocidente perdeu. A era da unipolaridade acabou, e o equilíbrio do mundo está a ser redesenhado — não por decreto, mas por força das circunstâncias.

É curioso notar como, no meio de tudo isto, o tempo parece tanto acelerar como parar.

Cada semana traz um novo escândalo, uma nova crise, uma nova urgência. Mas, no fim, o resultado é sempre o mesmo: nada muda. As estruturas de poder permanecem, as desigualdades persistem, os discursos repetem-se.

Esta estagnação é o verdadeiro drama do nosso tempo.

O mundo inteiro sente que algo tem de mudar, mas ninguém sabe como — ou tem coragem para o fazer.

Vivemos numa era de transição onde tudo é possível, exceto o que realmente importa.

Os sinais estão por todo o lado. No desgaste das democracias liberais, no regresso das economias mistas, na crise das elites, no ressurgimento da religião como força identitária, no cansaço coletivo de uma civilização que perdeu a fé em si própria.

O fim de uma era nunca é anunciado com claridade. Só se reconhece depois. Mas há momentos em que o ar se torna denso, em que o tempo se desacelera, e percebemos — ainda que sem o dizer — que algo terminou. 2025 foi, muito provavelmente, um desses anos.

Tudo o que parecia sólido começou a mostrar fendas. Tudo o que era estável tornou-se incerto. E tudo o que era distante começou a aproximar-se. O mundo deixou de ser previsível, e essa é talvez a sua nova normalidade.

No fundo, o que define este tempo não é o caos, mas a ausência de direção.

Vivemos num interregno — entre o passado que já não serve e o futuro que ainda não chegou. E é neste vazio que se desenham as novas linhas da história.

Os historiadores do futuro talvez descrevam estes anos como o crepúsculo do Ocidente — não como uma queda abrupta, mas como um longo entardecer, belo e melancólico, onde a luz resiste antes de desaparecer.

A questão que fica é simples e inquietante: quando virá o amanhecer?

Será 2026 o ano do ponto de viragem?

Ou continuará o mundo neste estado de suspensão, à espera de um sinal, de um gesto, de um acontecimento que redefina o curso da história?

Tudo aponta para que algo esteja a amadurecer nas sombras. A tensão entre o velho e o novo já não pode durar indefinidamente. Um evento — talvez pequeno, talvez inesperado — marcará a transição. A história, afinal, raramente avisa quando muda de direção.

O certo é que 2025 foi um ano de movimento sem avanço, de mudança sem transformação. Um ano em que o mundo pareceu andar em círculos, enquanto as forças profundas se reordenavam silenciosamente.

O Ocidente continua preso na sua própria narrativa, incapaz de se reinventar. O "Grande Sul" avança com paciência estratégica, consciente de que o tempo joga a seu favor. A balança do poder move-se lentamente, mas inexoravelmente.

E talvez este seja o maior ensinamento do ano: a mudança não acontece nas manchetes, mas nas marés subterrâneas da história.

O visível distrai, o invisível transforma.

Quando, um dia, olharmos para trás, perceberemos que 2025 não foi um ano estagnado — foi o intervalo entre dois mundos.


👉 Para mais reflexões e análises, assine a newsletter da (DES) POLÍTICA no LinkedIn https://lnkd.in/dWPje5_Q e visite www.realpolitik.org.uk


#politica #geopolitica #portugal #ocidente #grandesul #analise #mundo #transicao #economia #sociedade #democracia #crise #futuro #reflexao #historia #realpolitik #internacional #mudanca #2025 #despolitica