Jornalismo vs Jornalixo: A (irres)responsabilidade de informar

24-03-2024

A Senhora ia fugir, o marido dela tinha uma amante, o casamento estava terminado, os filhos já estavam afetados, a senhora estava morta!!!…

e mais milhares de "teorias" durante meses…

...e tudo baseado em "fontes seguras" e "declarações confirmadas".

A Princesa de Gales tem cancro!

Mas esqueçam a "Princesa"!

A Catarina (que também é o nome da minha filha) tem cancro.

Uma mulher jovem, com 3 filhos pequenos, tem esse "monstro" que tantas vidas ceifa (e eu que o diga)!

Não importam títulos, nem ideologias, nem nada!

Uma mulher como qualquer outra, com sentimentos, com medos, com uma vida pela frente, com sonhos e com projetos vê-se na eminência de perder tudo e não concretizar o sonho que qualquer pai tem: viver e ver os filhos crescer.

Estes são os factos!

Esta é realidade para qualquer pessoa que, tenha em si, um mínimo vestígio de inteligência, de decência, de humanidade.

Mas esta senhora foi, durante meses, completamente, devassada por uma matilha de "jornalistas" e "órgão de comunicação social" (ponho entre aspas por nem a uns nem a outros reconheço tal qualidade).

Mas ninguém, nenhum desses "jornalistas" (costumo chamar-lhes de "jornaleiros") veio, a público, pedir desculpa, retratar-se, assumir que foi incompetente, inconsequente, irresponsável, mentiroso, em suma, que foi uma besta, um asno, um pulha, que não merece nenhum dos dentes que tem na boca!

Nenhum!

Mais: a mesma vara está, agora, a comentar o cancro da pessoa a quem submeteram a uma enorme desumanidade, humilhação, devassa e injustiça.

Eu sou do tempo do figuras como Henrique Garcia, Raul Durão, Maria Elisa Domingues, Carlos Pinto Coelho, Rui Romano, Carlos Fino, do Mário Crespo, da Margarida Marante, Vasco Lourinho (sempre desde Madrid), Fátima Campos Ferreira (ainda, felizmente, no pleno ativo) e até do inesquecível Fernando Pessa que, já com 90 anos, nas ruas de Lisboa, fazia verdadeiro jornalismo ("e esta, hem?!!) e de tantos outros para quem o jornalismo era uma missão, um dever, em que se ouviam todas as partes, em que se confirmavam os factos, em que se validavam as fontes, em que se respeitava a dignidade dos cidadãos, enfim, se exercia o SERVIÇO de informar.

A notícia era o principal, os factos o essencial, o espectador o recetor e o jornalista, "simplesmente", o intermediário entre os factos e o cidadão com único (e mesmo único) propósito de Informar: objetivamente e imparcialmente.

Simples.

O jornalista informava e o cidadão formava a sua opinião.

Informar era conferir aos cidadãos um dos seus direitos mais fundamentais: ser informados (o que esta muito longe de ser "influenciado").

Hoje a informação é espetáculo, é sensação, é emoção, é "sangue", é circo, é arrogância, é imediatismo, noticiando primeiro, confirmando depois, destruindo vidas, carreiras, famílias, sem rigor em nada, sem respeito por nada para além da paranoia das audiências.

O jornalista é a vedeta, as audiências o objetivo, o espectador o consumidor e a notícias baseada em factos…. O que é mesmo isso ?….

Temos mais opinião que informação, mais comentário que reportagem, mais especulação que atualidade.

O jornalismo, atualmente, segue a máxima do grande Ian Fleming:

nunca deixes que a verdade estrague uma boa história!

E tudo isto sem consequências, sem a humildade de assumir o erro, sem vergonha, sem decência, sem valor.

Mesmo quando se recorre à justiça para repor a verdade avisam-nos logo que a justiça será feita…daqui a 6 ou 8 anos…..

Estamos na época do "jornalixo" e não do jornalismo.

Há exceções: como claro e felizmente!

Conheço algumas dessas que exceções. De alguns até sou amigo.

Mas a esmagadora maioria participa neste ataque nojento, cobarde e vulgar contra algo que devia ser um exemplo e uma fonte de aprendizagem para todos: a verdadeira, real e factual informação!