FIM DA GUERRA DA UCRÂNIA

30-04-2024


Há algumas certezas que temos em relação ao conflito que, desde 2022, opõe a Ucrânia à Rússia.

A primeira certeza, a mais óbvia e gritante, é que nunca devia ter acontecido.

Os Estados Unidos e os países da OTAN/NATO não deviam ter "aliciado" o inocente Zelensky a aderir à aliança, o Presidente Ucrânia não se devia ter deixado aliciar, violando o memorando de Budapeste, prevendo que a Rússia não ia reagir mesmo nada bem e, por fim, Vladimir Putin, independentemente dos argumentos políticos e diplomáticos, nunca, jamais e em tempo algum, devia ter invadido um país independente e soberano, violando, declarada e descaradamente, o direito internacional, para além de toda e qualquer ética, moral e respeito pelo Estado de Direito e pela dignidade e vida humana.

Por muitos erros diplomáticos que tenham cometido os países da OTAN/NATO e a Ucrânia nada, mas mesmo nada, justifica a invasão.

Outra certeza que temos é que o conflito dura há tempo demais, que já provocou demasiado sofrimento, morte, pobreza, desespero.

Mais uma certeza: o resto do mundo, em especial a Europa, não aguenta, por muito mais tempo, a pressão económico-financeira gerada por este conflito.

A incapacidade de controlar os preços dos produtos, dos combustíveis, de conter a inflação e as taxas de juro sem recurso a "mecanismos de estabilização" é disso prova.

Finalmente temos a certeza que o conflito terminará como terminaram todos os conflitos até hoje, como tudo termina neste mundo. Nem que dure cem anos (como já aconteceu na famosa... "Guerra dos 100 anos" que opôs França a Inglaterra entre 1337 e 1437... já lá vai um tempinho...).

Falta saber como e aí reside a "grande questão".

Como terminará a guerra?

Há várias hipóteses.

A primeira, claro, é a clássica em teoria militar: a capitulação e rendição incondicional de uma das partes.

Na minha opinião extremamente improvável.

A Rússia já provou que tem uma capacidade quase ilimitada para manter o conflito durante anos e anos.

Afinal, não nos podemos esquecer que, de facto, está em guerra com a Ucrânia desde 2014, mantendo também conflitos "quentes" na Síria e apoiando conflitos no centro de África e no Iémen.

Uma das" vantagens" da Rússia ser uma ditadura é que o seu presidente pode fazer o que quiser. O que, em democracia, implicaria forte oposição do eleitorado e perda do poder de qualquer presidente e governo, na Rússia não se aplica. Putin pode recrutar os soldados que quiser e estes têm de obedecer, pode afetar os recursos financeiros e industriais ao esforço de guerra nem que para isso condene a população à miséria, pode fazer tudo o que quiser para manter o conflito.

E não nos podemos esquecer de quem é Putin, do seu carácter e da sua personalidade em que "tudo" é, literalmente, tudo.

Sem qualquer tipo de barreira moral, ética ou de respeito mínimo pelos direitos e pela dignidade humana não há limites à ação do Presidente Russo. Não nos podemos esquecer que um dos ídolos de Putin, o Camarada Estaline, mandou para a morte 26 milhões de soldados e, que se saiba, nunca perdeu uma noite de sono por isso.

Depois a Rússia tem o apoio do Irão, da Coreia do Norte e, principalmente, da China. Mesmo que algumas áreas da Rússia entrem em rotura, seja a nível económico ou de material militar, poderá sempre contar com a ajuda e o apoio desses aliados.

Por último... a questão nuclear...

Ninguém vai arriscar saber se Putin está a fazer bluff ou não em relação à utilização de arsenal nuclear, não o estratégico, mas o tático.

Só esse fator impede, por exemplo, a interferência direta de forças de outros países no conflito pois, implicaria que Putin reclama-se, segundo o Direito Internacional, ingerência externa no conflito e assim a legitimidade do uso da força necessária... isto é.… a nuclear.

E por muito bonitas que sejam as intenções da OTAN/NATO ninguém vai arriscar uma guerra mundial e um conflito nuclear, especialmente quando é um homem como Putin que tem "o dedo no botão" e esse conflito não seria lá no longínquo Japão mas às portas da Europa.

Por muito "pequena" que fosse uma detonação nuclear na Ucrânia todos sofreríamos exposições consideráveis a radicação.

Qual será o político que correrá esse risco, assumirá essa responsabilidade?

Por isso: a Rússia não vai capitular.

Mas a Ucrânia também não!

Aquela gente é dura e heróica!!! (... para além de teimosa).

A história prova de durante 80 anos houve sempre pólos de resistência ucraniana à ocupação soviética. A Ucrânia nunca foi completamente "sovietizada". Estaline matou 10 milhões só no Holonodor, os ucranianos foram esmagados, perseguidos, enviados para Gulags aos milhões, mas nunca, nunca se renderam.

Mesmo que o ocidente se vá "acobardando" (ou deixando de suportar os custos) e deixando de fornecer material à Ucrânia, nem que seja com paus e pedras aquela gente valente não vai desistir, vai resistir até ao último sopro.

Por isso a Ucrânia também não vai capitular.

Assim a hipótese de alguém vencer este conflito é mesmo muito remota.

Então o que nos fica?

A via negocial, óbvio.

E a via negocial tem de partir, antes de mais e primeiro que tudo, do entendimento do que, de facto, é a Ucrânia e a sua história.

A história de Ucrânia é complexa e atribulada, sendo grande parte dessa história passada em conflitos.

Como área muito bem posicionada geograficamente, devido ao acesso privilegiado ao Mar Negro (garante o único ponto de maritimidade a quase todos os países eslavos e do bálticos), a Ucrânia também é uma potencia agrícola.

Mas a Ucrânia é imensa, sendo o segundo maior país da Europa em área logo depois do seu "querido vizinho", a Federação Russa.

E já explicamos, aqui, no Realpolitik que não há uma Ucrânia, mas sim 3: uma ocidental (com capital em Odessa), uma ucraniana-eslava (com capital em Kiev) e uma Ucrânia Russa (com capital em Kharkiv).

A via negocial, por isso, na minha opinião, deve passar, primeiro, pelo assumir esta diversidade.

Declarar que a Ucrânia é uma realidade política e não cultural nem social e que é preciso "alinhar" o plano político com o plano social e cultural e mesmo económico e diplomático. Isto pode passar pela criação de 3 Estados independentes, pela criação de um Estado único, mas baseado num sistema federativo ou, então, com uma redefinição de fronteiras.

Convenhamos que se é muito vantajoso para a "Ucrânia-Odessa" pertencer à União Europeia, é muito mais vantajoso para a "Ucrânia-Kharkiv" ser aliado e ter relações comerciais com a Federação Russa.

É tão obvio que chega a ser ridículo ter de o afirmar.

E a comunidade política, de Washington a Bruxelas, de Londres a Kiev já deviam ter chegado à conclusão que o conflito só terminará pela via negocial e que cada dia que passa sem se iniciar as negociações é um dia a mais de sofrimento, desespero, destruição e morte para a Ucrânia e o povo Ucraniano.

Mas também tem de entender que negociar implica exigir, mas também implica ceder, implicar ganhar mas também perder, que negociar é, precisamente chegar a termos razoáveis em que ambas as partes aceitem perder para conseguirem ganhar alguma coisa.

E, neste caso, essa "alguma coisa" é, antes de mais e indiscutivelmente, a paz.

A Ucrânia vai ter de ceder territórios, a Rússia vai também ter que ceder territórios (dos já conquistados), ambos terão que dar garantias de estabilidade futura e ambos terão de acordar termos que, por um lado, garantam a integridade territorial ucraniana e, por outra, o acesso da Rússia à rota do Mar Negro.

Não é assim tão complexo, pois não?

Não é quando há bom senso, inteligência, sentido de dever e de Estado.

Quando tudo isto falta, falta tudo.

E assim se perpetua pela teimosia, ignorância e arrogância algo que se era fácil de evitar continua a ser fácil de resolver se, quem manda, ponha acima de tudo o que está acima de tudo: a paz, a dignidade humana, a vida!


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