A POLÍTICA ALÉM DAS CORES PARTIDÁRIAS!

12-12-2023

PARA ALÉM DOS SLOGANS E BANDEIRAS, A ESSÊNCIA DA POLÍTICA REAL!

Uma frase muito ouvida, em especial em períodos eleitorais, ou pré-eleitorais ou pré-pré-ante eleitorais (que agora também os há!) é que os cidadãos, isto é, , os eleitores, os detentores supremos e únicos do direito de materializar, pelo voto, a verdadeira política, dizerem que "não ligam à política" ou, então, "não gostam de política"!

E essa frase, errada como veremos, essa confusão catastrófica entre dois termos distintos, quase díspares, tem-se materializado, muito clara, explicita e fundamentalmente, num aumento galopante dos índices de abstenção.

Também como veremos, mas noutra conversa, quem não vota também vota, mas tudo isto faz com que todo o sistema se subverta e, atualmente, em especial pela Europa, mas também pela América, tanto do Norte como do Sul, os eleitores (ou uma ínfima parte deles, que, com a abstenção são quem, de facto, quem escolhe os órgãos de poder), estão a eleger, legal e democraticamente, "forças" antidemocráticas.

Isto é: a democracia, ao aplicar-se, está-se a destruir.

E, na minha opinião, tal deve-se, muito a um fator: os cidadãos não sabem distinguir entre política e partidarismo.

Por isso vamos clarificar conceitos a ver se nos entendemos.

Política, segundo Aristóteles, que, há quase 3.000 anos, foi o primeiro a escrever um tratado sobre o assunto (o link para esta obra fundamental, e impressionantemente atual, está nos comentários), define o termo, simplesmente como:

a arte de governal a Polis, isto é, a cidade, ou, nos nossos dias e no nosso contexto, o Estado.

Muito simples:

Um grupo de cidadãos trata do dia-a-dia da cidade e faz o que tem que ser feito para que o Estado se mantenha em ordem, em segurança, que haja o que comer, trabalho, cuidados de saúde, habitação, em suma, manter os cidadãos o mais felizes e satisfeitos possível e cada vez mais prósperos.

Simples!

Isto é a política.

É como gerir uma casa, só que muito grande e com muita gente.

No entanto, e ao longo dos tempos, se o objetivo nunca deixou de ser o mesmo, os meios e os métodos para os atingir começaram a divergir, ou, antes, a ficar mais complexos.

Em primeiro lugar a divergência começou em como se obtém o direito de fazer essa gestão, isto é, de exercer o poder.

São os cidadãos que elegem os seus melhores, ou são selecionados pela riqueza, ou pelo poder militar, ou pela força e medo?

Depois, quando tempo e como se desenrola esse poder?

As pessoas "entram e saem", podem ser demitidas, ficam no poder a vida toda e depois a sua filha ou filho, por vontade divina, herda esse poder?

Como podem perceber, é na resposta a estas questões que encontramos os vários tipos de regimes como as repúblicas e as monarquias e os tipos de exercício de poder desde as democracias parlamentares, às ditaduras, oligarquias e tiranias.

Também, até aqui, nada de mais simples.

Quase todas as Nações tiveram de tudo, refletindo mais fatores externos do que internos, desde o período da história, os equilíbrios geopolíticos e geoestratégicos, variadíssimos fatores económico-financeiros, culturais, religiosos, entre muitos outros.

As culturas, os povos, as nações, tal como os Seres Humanos, também evoluem, também aprendem, também são capazes de grandes feitos, mas também de grandes erros...

Por isso quase todos passaram por quase tudo e quando, como se costuma dizer, não trouxe vantagem, trouxe aprendizagem!

O caso começa a tornar-se mais complexo quando se começa a questionar não a forma, mas o modo como se governa o Estado.

E aqui surgem as grandes divisões, especialmente a partir do século XVIII.

Uns afirmam que é o povo que deve, quase diretamente, governar, outros que o povo deve ser governado, levando a sua vida e entregando esse encargo, essa penosa tarefa, a quem o sabe, de facto, fazer; outros afirmam que o Estado é, de facto, de todos, por isso tudo é de todos, outros defendem que o Estado é a soma da propriedade dos seus cidadãos e cabe a cada um, sendo cada vez mais rico, fazer, por consequência, o Estado, por isso todos, mais ricos.

É aqui, do modo como se exerce o governo e as prioridades desse exercício, que encontramos as grandes filosofias políticas como o Liberalismo, o Comunismo, o Socialismo, a Social Democracia e até o Nacional Socialismo e o Fascismo porque, concordemos ou não, são, de facto e também, embora distorcidas, filosofias políticas e modos de exercer o poder.

Assim, e também por volta do século XIX (embora o fenómeno tivesse começado por volta do século XVI) , vários indivíduos, beneficiando, especialmente, das democracias mais ou menos representativas, começaram a unir-se "em volta" da filosofia que achavam mais eficaz, correta e justa para governar o seu país.

E os Partidos Políticos são só isso:

Grupos de cidadãos que partilham uma mesma ideia, um mesmo método, um mesmo modo de gerir a "Coisa Pública".

Claro que, em democracias, esses partidos, tentaram, desde sempre, convencer os restantes cidadãos eleitores, que o seu modo de governar, as suas ideias, os seus projetos eram os melhores e por isso, e só por isso, deviam votar neles.

Era o tempo da política civilizada, da política das convicções, em que se acreditava no que se dizia, em que se defendia o que se pensava e em que o bem da Nação, não era só um dos, mas o único propósito.

Era o tempo em que a política era um ato de servir a Pátria e um esforço para a deixar mais estável e próspera, embora, por vezes de um modo bastante distorcido.

Não se esqueçam que, para se conseguir isto, muitos trabalharam, muitos dedicaram a sua vida, deram o seu esforço, passaram sacrifícios, privações, muitos, mas muitos, perderam o seu modo de vida, os seus bens, as suas famílias, a liberdade e mesmo a vida.

Mas, em muitos países, como em Portugal, Angola, Brasil, e, felizmente, tantos outros, conseguiu-se a Liberdade e hoje desfrutamos do que chamamos de Estados de Direito Democrático.

O pior é que nos habituamos tanto que começamos a confundir a causa com a sua origem, começamos a perder a noção do verdadeiro objetivo e do real propósito.

Os partidos deixaram de ser grupos de cidadãos que partilham um ideal de governo para o país para passar a ser um grupo de cidadãos que quer conquistar o poder simplesmente pelo poder.

O poder deixou de ser um serviço para passar a estar ao serviço de grupos e interesses.

Os ideais, as ideologias, as filosofias políticas passaram a servir unicamente para definir nomes (atualmente nem isso)!

Desafio qualquer um de vocês a perguntar a qualquer membro de uma qualquer juventude partidária, as bases filosóficas do seu partido, os seus ideais fundamentais e o nome dos seus ideólogos fundadores.

Eu já fiz isso!

O resultado não foi bom!

E isto resultou em quê?

Não se faz política, porque, no fim de contas, a gestão da Polis, do Estado, o povo e o seu bem-estar e prosperidade são o que menos contam.

O que conta é a nomeação, é o cargo, é o posto, é a carreira.

Deixamos de ter indivíduos ao serviço do Estado e passamos a ter o Estado ao serviço de alguns indivíduos.

Por isso os cidadãos, os eleitores, quando dizem que não gostam ou não ligam à política estão errados.

O que eles não gostam, e bem, e até desprezam, e com razão, não é a política, mas o partidarismo, essa luta cada vez mais baixa, vil e exercida por indivíduos cada vez menos capazes, menos preparados, menos competentes, mas, por oposição, cada vez mais ambiciosos, interesseiros e egoístas.

Porque, reparem: quando o partido era um meio de servir, consumado o mandato, cada um seguia a sua vida, recompensado com o sentimento do dever cumprido.

Por isso o "desapego" era normal e, depois de algum tempo, até desejado, tal o desgaste que o real exercício e prática política acarretam.

Mas quando o partido é um modo de se servir as coisas são diferentes: porque deixa de ser um serviço e passa a ser um modo de vida, de sustento, de enriquecimento.

E isso muda tudo.

Por isso vemos partidos antidemocráticos no "panorama" político.

Diria mais: eles nem são antidemocráticos porque nem sabem o que é a democracia.

São, simplesmente, partidários, membros, quase como adeptos, filiados, que fazem tudo, dizem tudo com um único e um só único objetivo: serem eleitos.

Não importa ideais (que não sabem), não é relevante filosofias (que desconhecem), não são pertinente éticas, modos, fins e objetivos (que desprezam): o que importa é a conquista do poder pelo benefício que este pode trazer ao próprio e ao seu grupo próximo.

Por isso, hoje em dia, temos, por todo o ocidente, sistemas políticos sem política, temos sistemas que não se importam de paralisar todo o Estado, como aconteceu em Espanha e nos Estados Unidos, para que os partidos mantivessem as suas "posições" e as suas "influências".

Sobre este tema recomendo a leitura do livro "Os Engenheiros do Caos" do Giuliano da Empoli que deixo o link nos comentários.

É preciso submeter os partidos à política e libertar a política dos partidos, pelo menos tal como hoje se compõe e estruturam.

É preciso restituir aos cidadãos a noção do que é, de facto e verdadeiramente, a política.

É preciso que se comece a fazer política em vez de partidarismo e é imperioso que a política seja exercida por políticos e não por membros partidários.

Porque se isso não acontecer corremos o sério risco de a democracia ser apenas mais um conceito que encobre precisamente o seu oposto.


Obras Recomendadas

A Política – Aristóteles - https://amzn.to/46SwrWM

Os Engenheiros do Caos - Giuliano da Empoli - https://amzn.to/4a5h9AF