A ESTRATÉGIA GLOBAL (E LETAL) DO IRÃO !
Convenhamos que, os últimos tempos, têm sido agitados em termos de política internacional, em especial no que diz respeito a conflitos armados.
Para além da guerra da Ucrânia que, todos diziam que ia ser rápida (eu inclusive) e que se estende dia depois de dia, mês depois de mês, até já ano depois de ano, juntou-se o conflito na Faixa de Gaza e, depois o intensificar dos ataques Houthis do Iémen às rotas comerciais do mar vermelho, em especial e especificamente as que envolvem navios e cargas ocidentais.
A tudo isto acrescenta-se a continuidade e mesmo o aumento da atividade no Sahel em África que, a efectivar-se o controlo terrorista desta zona, permitiria que ambas as margens do Mar Vermelho, logo do acesso ao Canal do Suez, ficassem fora de controlo, mas também, através da Mauritânia, o controlo do acesso ao Golfo da Guiné.
Assim o controlo do Sahel põe em risco as duas rotas que ligam o Indico-Pacifico ao Atlântico: tanto a rota do canal do Suez como também a dispendiosa mas ainda praticável Rota do Cabo, contornando todo o continente africano.
O que tudo isto tem em comum?
Duas coisas: primeiro, envolvem interesses ocidentais, especialmente dos Estados Unidos e, segundo, tem como principal "motivador" o Irão.
E porquê isto tudo?
As razões de base são antigas, muito antigas, remontam à década de 70 do século XX, quando o regime do Xá, Reza Pahlavi, um dos principais aliados dos Estados Unidos, em especial na luta anti-comunista, caiu e se institui a teocracia iraniana com o poder dos Aiatolas.
Em 1979 as coisas não correram propriamente bem entre o primeiro Aiatolá, Khomeini, e os Estados Unidos, tendo muitos americanos ficado reféns, durante longo tempo, no Irão.
E desde aí as relações só se tem deteriorado.
Durante algum tempo os Estados Unidos travaram uma guerra por procuração, a guerra Irão-Iraque, entre 1980 e 1988, em que os dois blocos, americano e soviético, se confrontaram, com os Estados Unidos a apoiar o regime do Iraque e Saddam Hussein (o que depois se tornou inimigo e foi derrubado, perseguido, capturado e executado pelos mesmos Estados Unidos) e a União Soviética a apoiar o Irão.
O fim da guerra acontece como consequência direta do início da derrocada do bloco soviético.
Claro que o Irão saiu fragilizado desta situação pois é o seu aliado que capitula.
No entanto as relações entre Teerão e Moscovo mantém-se boas e estáveis até hoje.
É o que Irão tem uma posição muito delicada em termos geopolíticos.
Embora islâmico é xiita, enquanto todos os outros Estados da região são sunitas, por isso o Irão não tem aliados mesmo entre os países da mesma religião que, na zona, é o fator congregador e de manutenção da estabilidade entre as nações.
Para além disso está próximo de Israel que, de bom grado, derrubaria o regime teocrático.
Depois há o eterno inimigo americano.
E isto num país que inspira a cobiça do mundo pois detém umas das maiores reservas globais de petróleo e tem um posicionamento geográfico que o torna extremamente relevante, logo apetecível, em termos geoestratégicos.
Em resumo: todos querem controlar, de um modo ou de outro, o Irão.
Mas o Irão está sozinho e assim tem de manter a sua soberania, segurança, relevância e influência pois é o único modo de sobreviver tanto enquanto nação como enquanto regime.
Depois do fim da guerra e do apoio da união soviética decidiu tentar o seu próprio programa nuclear.
Deter arsenal nuclear é sempre uma garantia, um fator fortemente dissuasor para que outros países tentem alguma coisa contra um regime.
Veja-se o caso do Paquistão e da Coreia do Norte que se não tivessem armas nucleares quase de certeza já não existiriam, tantos e tão fortes são os seus opositores e inimigos.
Mas vários reveses, a incapacidade de aceder a tecnologia e a material nuclear suficientemente puro necessário para conceber uma arma nuclear funcional e várias e muito bem sucedidas ações de sabotagem especialmente da MOSSAD não (ou ainda não) tornaram possível atingir esse objetivo.
Mas com a guerra na Ucrânia o Irão viu a sua oportunidade.
Com os Estados Unidos quase a sustentar o conflito (que, em rigor, provocaram), com uma política interna feita em pedaços e com umas eleições presidenciais a aproximar-se com uma disputa que se advinha caótica e altamente desgastante para o prestígio e estabilidade americana, o Irão viu a sua oportunidade de ouro.
E tomou uma ação estratégica antiga mas muito eficaz: quanto mais fraco está o inimigo mais fácil é de derrotar.
Mais, o inimigo pode ficar tão frágil que se atinja o zénite absoluto do sucesso na guerra: vencer sem lutar.
E é isto que o Irão está a fazer.
A criar, apoiar e incentivar, sem, no entanto, se envolver diretamente, vários conflitos, dispersos, contínuos, contra aliados e interesses norte americanos.
E os Estados Unidos têm de intervir em todos!
Tiveram de apoiar Israel depois do ataque do Hamas, tem de proteger as rotas do mar vermelho, tem de continuar a apoiar a Ucrânia que está numa situação cada vez mais dramática, tem de manter alguma estabilidade no Shael.
E tudo isto ao mesmo tempo, e tudo isto a passar uma crise económica e social, tudo isto com um presidente enfraquecido e um candidato republicano, quem mais que Donald Trump, a ser o primeiro a apontar as fragilidades e lacunas do sistema.
Como não fosse o suficiente os Estados Unidos estão fortemente pressionados em manter a sua influência, pois sabem que, na primeira oportunidade, a China, que, como sempre, espera na sombra o momento certo para atacar, o fará com toda a força e astúcia e vencerá a "guerra comercial", colocando os Estados Unidos numa posição muito, mas muito delicada em termos globais.
Depois há todo o "património" de imagem e prestígio dos Estados Unidos em relação à comunidade internacional e o seu nível de influência.
O que será do "orgulho americano" se Putin vencer o conflito, se a titânica frota americana não conseguir manter a segurança da sua marinha mercante no Indico-Passifico, se Israel não conseguir impor ordem na faixa de Gaza e ter que ceder, se a China conseguir impor a sua hegemonia comercial no Índico -pacifico, ficando os Estados Unidos completamente reféns das decisões de Pequim?
… torna-se notório que os Estados Unidos é uma potência sem poder, um "tigre de papel", que só diz que faz mas quando tem que o fazer fracassa a todos os níveis.
É este desgaste que o Irão, por certo com o apoio da Rússia e da China, está a conseguir.
Toda esta situação, se em termos morais é uma catástrofe, pois estamos a falar de um Estado opressor, déspota e tirano a vários níveis, levar a melhor e vencer Estados de direito democrático, do ponto de vista de geoestratégia e política é absolutamente brilhante.
Temo que, conforme se forem aproximando as eleições americanas, outros episódios e focos de tensão irão aparecer deixando os Estados Unidos e os seus aliados cada vez mais divididos, mais assoberbados, mais fracos e mais frágeis.
Pode-se contrariar este movimento do Irão e dos seus aliados?
Agora é difícil.
Teria sido mais fácil se o ocidente não tivesse menosprezado o Irão, se não tivesse acreditado que as sansões económicas eram o bastante para controlar o regime de Teerão, se não tivesse, em suma, cometido o erro mais grave de toda a política: subestimado o inimigo.
Agora a única hipótese é criar prioridades e acudir a cada um destes focos de tensão segundo essas prioridades.
Mas isso implica, obviamente, a diminuição do apoio e suporte a alguns destes centros de tensão e, logo, o aumento da sua exposição e vulnerabilidade, logo, a possibilidade de danos avultados ou mesmo a derrota.
Os Estados Unidos e aliados colocaram-se, inocente e estupidamente, numa situação que terão que optar pelo mal menor.
O pior é que o menor de qualquer um dos males é suficientemente grande para causar danos profundos na estabilidade do ocidente e na vida de todos nós.
O que optar: perder a Ucrânia ou o controlo do mar vermelho por onde passa 15% do comércio mundial e 70% do comércio com destino à Europa? O que é preferível: uma vitória de Putin ou a vitória de grupos terroristas que controlaram África desde o Atlântico ao Índico?
Seja qual for o resultado os Estados Unidos já estão derrotados e a Europa, mais uma vez, e devido, mais uma vez, a esta subserviência quase ridícula aos americanos, está exposta, frágil, a pontos de agravar uma crise económica que já é profunda.
Porque nos colocamos, de novo, nesta situação?
Porque deixamos que políticos inaptos e incompetentes, sem pensamento estratégico, nos conduzam a crise depois de crise?
Porque não impomos políticas que, de facto e estrategicamente, protejam, a longo prazo, os nossos interesses e a nossa estabilidade em termos globais?
São perguntas ingratas, mas que tarde ou cedo teremos que responder, e resolver.
Espero que a tempo da única resposta possível não seja a nossa derrota, na nossa capitulação, a perda da Liberdade, da Democracia e dos Direitos Humanos.
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