25 de ABRIL, 51 ANOS VITÓRIA OU FRACASSO?

Passaram-se 51 anos desde aquela madrugada histórica de 25 de Abril de 1974, dia que não só alterou para sempre o rumo de Portugal, como também redefiniu a essência do nosso ser enquanto nação.
Naquele dia, o país despertou para uma nova realidade, em que o clamor pela liberdade e pela dignidade humana se fez sentir com força avassaladora.
Foi o instante em que o povo, cansado do peso de décadas de repressão e censura, uniu-se para derrubar um regime totalitário, abrindo as portas para uma era de esperanças e de reconstrução dos valores sociais e políticos.
Contudo, a memória dos ideais de Abril tem-se vindo a tornar objeto de intensos debates e, muitas vezes, de desilusões.
Um ano após a imensa confusão que marcou as comemorações do cinquentenário, as vozes que hoje se elevam estão carregadas de críticas e de uma sensação de que os princípios que naquela manhã foram tão vibrantes foram, com o passar dos anos, corrompidos ou, pelo menos, negligenciados.
Fala-se de como o processo revolucionário, por vezes, se desvirtuou e de como se poderia ter mantido a fidelidade aos ideais originais, caso estes tivessem sido preservados com maior rigor.
Mas será mesmo assim que a história se pode julgar?
De facto, o panorama das últimas cinco décadas apresenta uma realidade complexa e multifacetada.
Portugal, embora tenha registado progressos inegáveis em áreas como a educação, a saúde e a inclusão social, parece ainda afligido por desafios estruturais profundos.
Apesar de nos termos tornado numa nação moderna, o nosso país continua, em muitos aspetos, a permanecer na "cauda da Europa", lutando para se afirmar num cenário internacional cada vez mais competitivo e exigente.
O nosso regime político, frequentemente descrito como fraco e anémico, não consegue, por vezes, responder de forma enérgica aos problemas que afetam a sociedade.
Ao mesmo tempo, a economia, que deveria ser o motor do desenvolvimento, vê-se refém de um ciclo de dificuldades que lhe impede de prosperar de forma sustentável.
As instituições que se erigiram após a revolução continuam a enfrentar críticas que apontam para uma gestão ineficaz e, muitas vezes, para a perpetuação de práticas que minam a confiança dos cidadãos.
Vivemos num contexto em que o nível de vida dos portugueses parece diminuir gradualmente: os mais desfavorecidos ficam ainda mais marginalizados, enquanto a classe média se vê asfixiada por taxas, impostos e uma burocracia que parece mais interessada em manter um status quo do que em promover verdadeiras mudanças.
A justiça, por sua vez, é frequentemente acusada de ser "forte para os fracos e fraca para os fortes", perpetuando um ciclo de desconfiança e de frustração que se reflete no quotidiano de muitos.
Apesar destes desafios, é essencial recordar que o 25 de Abril não foi, no seu cerne, uma revolução de políticas imediatas ou de medidas concretas.
O verdadeiro triunfo daquele dia residiu na revolução das ideias, na substituição de um regime de terror e opressão por uma democracia que se fundamenta na liberdade, na dignidade e no respeito pelos direitos humanos.
Foi o início de um novo pacto social, em que o despotismo deu lugar à possibilidade de cada cidadão expressar-se, criticar e, acima de tudo, sonhar com um futuro diferente.
Este legado, que nos foi confiado pelos "capitães de Abril", é o bem mais precioso que herdámos, e o seu valor transcende qualquer avaliação puramente material ou económica.
A discussão acerca das políticas implementadas no novo contexto democrático é um terreno fértil para opiniões divergentes.
Há quem acredite que certas decisões – desde a forma como foi conduzida a descolonização até à integração na União Europeia – desviaram-nos do caminho que, de facto, prometia a emancipação total do povo português.
Outros apontam para a corrupção endémica, para a falta de visão estratégica dos sucessivos governos ou para a dependência excessiva de fatores externos, como os mercados internacionais, como os principais responsáveis por alguns dos percalços que enfrentámos.
Cada perspectiva traz à tona uma reflexão necessária: a de que, se tivéssemos sido fiéis aos ideais proclamados naquela madrugada, talvez o país hoje desfrutasse de uma estabilidade e de um progresso ainda mais marcantes.
Não obstante, este debate não deve desviar o nosso foco do que verdadeiramente importa: a liberdade conquistada.
Pois é essa liberdade que nos permite, a cada dia, questionar, criticar e propor mudanças – um instrumento vital para o aperfeiçoamento contínuo da nossa sociedade.
É através da liberdade que conseguimos reconhecer as falhas e os erros, mas também celebrar as conquistas que, apesar dos obstáculos, moldaram um país mais justo e inclusivo.
O fato de estarmos hoje a debater abertamente os desafios e as imperfeições do nosso sistema político e económico é prova inegável de que o espírito de Abril continua vivo, mesmo que em forma de crítica e de constante autoavaliação.
É igualmente importante reconhecer que os últimos 51 anos foram marcados por uma série de avanços sociais e culturais que, de outra forma, seriam impensáveis num regime fechado e autoritário.
O acesso à educação, a liberdade de expressão e a promoção dos direitos civis e humanos são conquistas que têm permitido a cada geração a possibilidade de lutar por um país melhor.
Contudo, estes progressos coexistem com a sensação de que, enquanto nações europeias avançam em inovação e competitividade, Portugal ainda se debate com questões estruturais que lhe impedem de alcançar o mesmo patamar de desenvolvimento.
A modernidade trouxe consigo desafios nunca antes imaginados.
A globalização, as crises financeiras e a instabilidade política são apenas alguns dos fatores que hoje pesam sobre os ombros da sociedade portuguesa.
Estas dificuldades, embora reais e impactantes, não podem eclipsar o facto de que a liberdade de pensar e de agir permanece como o nosso maior trunfo.
É precisamente através dessa liberdade que podemos construir uma sociedade mais resiliente, capaz de enfrentar os problemas com criatividade e determinação.
O nosso compromisso com a democracia exige que nunca nos acomodemos, que continuemos a lutar contra a corrupção e a ineficiência, e que sejamos sempre vigilantes na defesa dos direitos e das liberdades de cada cidadão.
Neste sentido, o 25 de Abril deve ser encarado não como um ponto de chegada, mas como o ponto de partida de uma jornada contínua.
Uma jornada que, embora repleta de desafios, está também cheia de oportunidades e de possibilidades para um futuro mais promissor.
Cada cidadão, ao exercer a sua liberdade de voto, de expressão e de crítica, reafirma o compromisso com a construção de um país onde a justiça, a equidade e o progresso sejam realidades concretas.
É um caminho que nos convida a reavaliar constantemente as nossas escolhas, a aprender com os erros do passado e a trabalhar com afinco para transformar as promessas revolucionárias em conquistas diárias.
A liberdade, essa conquista que nos foi legada com tanto esforço, não é um bem que se adquire uma única vez e se mantém inalterado.
Trata-se de um processo dinâmico, que exige o empenho constante de cada um de nós para que não se perca o seu sentido original.
É preciso reconhecer que, em muitos momentos, permitimos que práticas corruptas e uma gestão ineficiente minassem os alicerces da nossa democracia.
Mas, simultaneamente, demonstramos uma notável capacidade de resiliência e de reinvenção, características que nos permitem manter acesa a chama da esperança mesmo nos momentos mais difíceis.
Neste dia de comemoração e de reflexão, é fundamental que celebremos não apenas as vitórias, mas também a coragem de continuar a lutar pelos ideais que nos foram transmitidos há 51 anos.
Devemos reconhecer que cada desafio enfrentado é uma oportunidade para reforçar o nosso compromisso com um país mais justo e solidário.
A liberdade que conquistámos é, acima de tudo, uma responsabilidade que recai sobre cada cidadão: a responsabilidade de exigir mais dos nossos governantes, de contribuir com o nosso esforço pessoal para a melhoria da sociedade e de nunca permitir que a chama da liberdade se apague.
Por isso, hoje, ao recordarmos os heróis que, há meio século, ousaram sonhar com um país livre, é imprescindível que nos lembremos de que a verdadeira revolução não acabou naquele dia.
Continuamos, a cada instante, a escrever a nossa história, enfrentando os desafios com a certeza de que a liberdade é o bem mais precioso que possuímos.
Que este legado inspire a todos nós a manter a vigilância, a exercer o nosso direito de criticar e a trabalhar incessantemente por um futuro em que os ideais de Abril se concretizem plenamente na vida de cada cidadão.
Que os ideais de Abril continuem a servir-nos de farol, iluminando o caminho através das adversidades e lembrando-nos sempre que, apesar de todas as dificuldades, a liberdade é uma conquista que vale infinitamente a pena.
Que possamos, juntos, honrar esse legado, reconhecendo que o verdadeiro sucesso da revolução reside na capacidade de transformar sonhos em realidade, mesmo que essa transformação exija sacrifícios e um esforço diário.
Afinal, é na persistência e na coragem de cada um que se encontra a verdadeira essência do 25 de Abril, um dia que, há 51 anos, nos ensinou que a liberdade é, e sempre será, o maior tesouro de Portugal.